Revisão de contratos na pandemia: ainda é possível fazer?

É possível realizar a revisão de contratos na pandemia? Mesmo após dois anos, ainda estamos vivendo as consequências da disseminação da Covid-19. A desaceleração da economia, somada às medidas de restrições, trouxeram consequências para todos. Para as empresas, além das adversidades financeiras, muitas encontraram dificuldades na hora de manter, ou mesmo cumprir, seus contratos. 

Na medida em que as atividades estão retornando, inúmeras relações comerciais que ficaram suspensas voltam a ser reativadas. Nesse cenário, é comum que empresários tenham dúvidas sobre o que fazer em relação ao descumprimento de contratos. Em outras palavras, muitos querem saber quais são as medidas jurídicas que podem ser tomadas tanto quando a empresa deixou de cumprir com as suas obrigações, bem como, no caso de clientes e fornecedores que não respeitaram as regras estabelecidas. Afinal, é possível realizar qualquer ação em situações assim. É sobre esse tema que vamos esclarecer as principais dúvidas nesse post. Confira!

Os contratos e a pandemia

Para entender como ficam os contratos diante das consequências geradas pela pandemia, é essencial entender alguns conceitos. Sempre que temos um contrato válido, ou seja, um acordo firmado com base em um objeto lícito, com forma prescrita em lei e assinado por partes capazes, costumamos dizer que esse documento faz lei entre as partes. 

No caso da pandemia, sabemos que governos de todas as esferas, isto é, federal, estadual e municipal, editaram leis trazendo medidas excepcionais por conta da Covid-19. Contudo, embora essas leis tenham afetado as partes contratantes, elas não impactam o contrato em si, já que não atingem relações privadas. 

Porém, mesmo diante desse fato, isso não significa que os contratos sejam imutáveis. Caso exista o que chamamos de “caso fortuito” ou “força maior”, que gera um desequilíbrio dentro da relação contratual estabelecida, é possível sim rever, repactuar ou mesmo rescindir o acordo. Assim, costumamos dizer que os contratos estão sujeitos à chamada “teoria da imprevisão”, o que na prática significa que as partes podem repactuar ou mesmo romper um contrato caso não seja possível manter as mesmas condições existentes quando elas decidiram firmar o acordo. A teoria da imprevisão, no entanto, só se aplica quando existirem situações externas, que afetam a relação contratual, porém que não poderiam ser previstas na época em que as partes fecharam seus termos. 

A maioria dos tribunais já reconhece a pandemia como um acontecimento extraordinário e imprevisível que pode dar margem à revisão dos contratos. Contudo, esse entendimento, por si só, não é suficiente para desconsiderar as obrigações previstas no contrato, ou mesmo, implicar na sua rescisão. 

Revisão de contratos na pandemia e os tribunais

Existem inúmeros tipos de contratos que acabaram sendo afetados pela pandemia. Contratos de locação, de financiamento, empreitada, prestação de serviços, empréstimos, cessão de quotas, são apenas alguns exemplos. De maneira geral, todos aqueles contratos que tratam sobre parcelamentos ou obrigações futuras, naturalmente, foram impactados pelas consequências da Covid-19. 

Porém, para os Tribunais brasileiros, a teoria da imprevisão não se aplica aos contratos por si só. É preciso que uma das partes comprove a onerosidade excessiva. É o caso por exemplo, dessa decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que determinou a revisão de um contrato de locação comercial de uma loja em um shopping center: 

“1. Os arts. 317 e 478, ambos do Código Civil, possibilitam a revisão contratual em razão de fato superveniente, quando houver acontecimento imprevisível, que gere onerosidade excessiva a uma das partes. 2. É evidente que se vive uma situação excepcional em razão da pandemia gerada pelo novo coronavírus. Com efeito, é possível a modificação do contrato celebrado, por tornar-se excessiva a prestação, em face de eventos futuros e imprevisíveis. De fato, a pandemia que se vive constitui fato extraordinário, que pode tornar o contrato de aluguel excessivamente oneroso para o inquilino, sobretudo quando este se encontra impossibilitado de exercer sua atividade comercial em razão de o Governo local ter determinado o fechamento temporário dos estabelecimentos.”

(Acórdão 1363974, 07453032920208070000, Relator: ARNOLDO CAMANHO, Quarta Turma Cível, data de julgamento: 12/8/2021, publicado no DJE: 30/8/2021)

No caso do Judiciário do Rio Grande do Sul, encontramos diversas decisões que  reconhecem a pandemia como causa de suspensão de obrigações (teoria da imprevisão) e autoriza a sustação de protesto de títulos, por exemplo. 

Em outros casos, no entanto, alguns Tribunais entenderam que, como as circunstâncias da pandemia acabaram afetando a todos e desequilibrando a relação e as partes da mesma forma, não cabe a aplicação da teoria da imprevisão. Nesse sentido, temos uma decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina envolvendo um contrato de financiamento de um veículo, que entendeu que 

“A teoria da imprevisão abre a possibilidade de resolução ou revisão do contrato quando da ocorrência de fatos novos e imprevisíveis às partes, sem que tenham contribuído para a situação. A propósito, em razão de as consequências econômicas da pandemia de Covid-19 terem sido sentidas tanto pelo agravante como pela agravada, não se pode aplicar a teoria da imprevisão para favorecer apenas uma das partes, o que já foi dito nesta Corte” 

(Agravo de Instrumento n. 002655-79.2021.8.24.0000/SC)

Minha empresa tem contratos descumpridos, o que fazer?

Como vimos, a aplicação da teoria da imprevisão não ocorre simplesmente em razão do evento pandemia. Em alguns casos, como vimos, os Tribunais entendem que ela não se aplica. 

Para empresas que possuem uma grande quantidade de contratos com pendências, ou ainda, começaram a receber notificações extrajudiciais em razão do descumprimento de cláusulas contratuais, o melhor caminho é buscar um advogado especializado que possa analisar cada caso, bem como, avaliar quais são as medidas que os Tribunais estão aplicando a situações semelhantes. Com base nisso, o profissional pode oferecer tanto uma orientação precisa, quanto um prognóstico para a empresa.

Buscar uma orientação profissional, especialmente diante de notificações extrajudiciais, pode evitar inúmeros processos e desgastes decorrentes de uma ação judicial. Nesse sentido, montar uma estratégia e ter uma orientação o quanto antes pode ensejar inúmeros benefícios para a empresa. 

Tem dúvidas sobre a revisão de contratos na pandemia e busca uma orientação? Entre em contato e saiba mais.